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“Tudo começou com o sopapo” — a origem de um coletivo que faz da arte um chamado à resistência

“Tudo começou com o sopapo” — a origem de um coletivo que faz da arte um chamado à resistência

"Como é que a gente fez isso tudo? Como é que conseguimos?". A pergunta, feita por Maritza Flores durante a entrevista, ecoa como uma síntese potente da trajetória do Centro Odara, coletivo que completa 25 anos em 2024. Fundado no rastro vibrante do projeto Cabobu, que resgatou o tambor de sopapo em Pelotas no início dos anos 2000, o Odara transformou o impulso de um evento em ação contínua. Hoje, dança, percussão e educação antirracista se misturam à história viva da cidade, projetando resistência e encantamento.

O programa Contraponto, da RádioCom Pelotas, recebeu na quinta-feira, 10 de abril, Maritza Flores Ferreira Freitas, coordenadora do Centro Odara, para uma conversa sobre a fundação e o percurso do coletivo. Professora aposentada, mulher preta, militante do Movimento Negro, Maritza compartilhou lembranças, marcos e desafios que marcaram esse quarto de século dedicado à arte, à cultura negra e à mobilização social.

O surgimento: do pulsar do tambor ao nascimento do coletivo

O embrião do Centro Odara foi o projeto Cabobu, idealizado pelo músico pelotense Giba Giba. Com foco no resgate do tambor de sopapo, o evento envolveu oficinas, apresentações e mobilizações culturais que tomaram as ruas de Pelotas entre 1999 e 2000. Maritza, ao lado da professora Raquel Silveira, integrou o corpo coreográfico do projeto, que reuniu 40 tambores em uma apresentação marcante no Mercado Público.

Com o encerramento do evento, surgiu o sentimento de continuidade. "O que fazer com tudo isso agora?", recorda Maritza, ao relatar a provocação feita pelo mestre Batista, responsável pelas oficinas de construção dos tambores. Da inquietação coletiva nasceu a ideia de um projeto que unisse dança e percussão como elementos de transformação.

Foi no Colégio Pelotense, onde Maritza lecionou por 27 anos, que o grupo começou a se reunir para estruturar o que viria a se tornar o Odara. O nome foi inspirado no livro "Odara: sonho e fantasia", da escritora pelotense Maria Helena Vargas. "Fomos atrás do significado e descobrimos que Odara, no iorubá, é sonho, encantamento. Foi aí que tudo se conectou", explica.

Frentes de atuação: arte, educação e resistência negra

Ao longo das últimas duas décadas e meia, o Centro Odara expandiu seu trabalho para muito além das apresentações artísticas. Embora o tambor e a dança afro sigam sendo o ponto de partida, o coletivo construiu uma atuação sólida na área da educação, especialmente com foco na Lei 10.639, que institui o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas.

Maritza destaca a atuação em rodas de conversa, oficinas práticas, formações para professores e intervenções culturais. "É um trabalho feito com seriedade, com base no que é vivido e construído coletivamente. Atuamos em escolas públicas, universidades, eventos e seminários, dentro e fora de Pelotas", afirma.

Atualmente, o coletivo trabalha na execução de três projetos importantes com apoio de emendas parlamentares. Um deles, em parceria com o GAMP (Grupo Autônomo de Mulheres de Pelotas), é voltado à saúde da mulher com enfoque na integração corpo-mente. Outro, com financiamento da deputada Daiana Santos, foca na formação pedagógica. Um terceiro projeto, aguardando liberação da Prefeitura, também terá como público professores e estudantes.

Campanha de memória e celebração dos 25 anos

Para marcar os 25 anos, o coletivo lançou a campanha “25 anos em 25 dias”, desenvolvida por Tuanny Marcarenhas, responsável pela PretaTu – Assessoria de Mídia e Comunicação, integrante da coordenação do Odara e também sua tesoureira. Ela tem divulgado registros históricos nas redes sociais do grupo. A iniciativa busca não apenas resgatar momentos importantes da trajetória, mas também provocar reflexões sobre o que foi construído, o que ainda falta fazer e o valor da coletividade na construção dessa história.

"Às vezes a gente não se dá conta do quanto já fez. Mas é importante reconhecer o tanto que se construiu e saber que foi sempre no coletivo. No Odara, não existe espaço para individualidade", afirma Maritza. Ela reforça que o segredo da longevidade está na escuta e na partilha de saberes, algo que mantém o grupo ativo, relevante e conectado com a cidade.

Celebração e programação especial

A celebração dos 25 anos acontece neste sábado, 12 de abril, no Espaço de Arte Popular – Encontro de Saberes da Universidade Federal de Pelotas (EAP/UFPel). O evento contará com uma exposição sobre a trajetória do coletivo, vivências de percussão com o mestre griô Dilermando Freitas, dança afro e um momento de confraternização.

As atividades fazem parte da programação regular do Odara, que se reúne todos os sábados, a partir das 14h, no EAP/UFPel. O espaço é uma conquista importante do coletivo e se tornou ponto de encontro para práticas artísticas e rodas de conversa que conectam corpo, memória e resistência.

"É o nosso jeito de celebrar: com tambor, dança, conversa e afeto. É uma gira de continuidade, que celebra o que já foi e o que ainda vem", conclui Maritza.

Serviço

Odara em Movimento: Tambor e Corpo na Gira dos 25

Data: sábado, 12 de abril

Horário: a partir das 14h

Local: EAP – Espaço de Arte Popular: Encontro de Saberes da UFPel – Rua Benjamin Constant, 1071, Pelotas

Descrição: Celebração dos 25 anos do Centro Odara com exposição, oficinas de percussão, dança afro e rodas de conversa. Evento gratuito e aberto ao público.

*Confira a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.


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