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Na reta final de campanha, urnas eletrônicas são as vilãs em grupo bolsonarista

Na reta final de campanha, urnas eletrônicas são as vilãs em grupo bolsonarista

As urnas eletrônicas passaram a ser o principal alvo de grupos bolsonaristas nas redes sociais na última semana de campanha, quando as chances do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vencer a disputa ainda no primeiro turno foram detectadas pelos principais institutos de pesquisa do país. A reportagem do Sul21 acompanhou um grupo de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, no WhatsApp. Entre vídeos, memes e orações, os apoiadores compartilharam notícias falsas sobre violação de urnas, fraude no sistema de votação e alteração dos resultados eleitorais.

O grupo tem 83 participantes e foi criado em 14 de maio deste ano para divulgar a campanha a deputado estadual de um candidato bolsonarista. Reúne eleitores de várias cidades do Rio Grande do Sul, a maioria da Serra e do Norte gaúchos – regiões onde Bolsonaro leva vantagem sobre Lula. Alguns perfis ostentam fotografias do presidente ou bandeiras do Brasil, além de frases sobre Deus, família e liberdade.

Entre os vídeos demonizando a urna eletrônica está de eleitora com sotaque carioca que denuncia uma suposta fraude patrocinada pelo próprio TSE, que incluiu uma área de confirmação do voto nas máquinas distribuídas para a eleição de 2022. Segundo o vídeo, que tem dois minutos e meio de duração, se o eleitor apertar na tecla verde antes da tela de confirmação desaparecer, terá perdido seu voto.

O conteúdo foi amplamente compartilhado no grupo e gerou dezenas de comentários, alguns até mesmo suspeitando de que seria uma notícia falsa da esquerda para confundir os eleitores de Bolsonaro. “Não será faik Niws para nos confundir?”, perguntou uma participante. A Justiça eleitoral negou a hipótese. “O vídeo distorce informações sobre uma medida criada pela Justiça eleitoral para estimular que o eleitor faça a conferência do próprio voto”, desmentiu o TSE em publicação na última terça-feira (27).

Outro vídeo muito compartilhado pelo grupo mostra o presidente Bolsonaro ao lado do ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, candidato ao Senado por São Paulo, em que divulga uma mentira sobre a intenção do TSE de proibir eleitores de vestirem a camiseta da seleção brasileira no dia da votação. “Como é que é, Alexandre? Proibir de usar a camisa da seleção? Olha, tem interferência demais. Ele tá com medo de quê?”, pergunta Bolsonaro no vídeo. O presidente diz que as Forças Armadas estarão fiscalizando e ameaça de não permitir a votação nas seções em que houver a proibição. A informação falsa foi transmitida na live presidencial da quarta-feira (28).

O TSE nunca cogitou proibir o uso de qualquer tipo de roupa no dia da votação, muito menos da seleção brasileira. As únicas vedações são impostas às pessoas que estão a serviço da Justiça eleitoral, como mesários, secretários e presidentes de mesa, que não podem ostentar camisetas ou objetos com propaganda de nenhum partido, federação ou candidato dentro das seções eleitorais. O que se discutiu, a pedido das centrais sindicais, foi impedir que mesários e presidentes de mesa fossem trabalhar de verde e amarelo. O Tribunal negou o pedido.

A intensificação do ataque às urnas eletrônicas na última semana antes do pleito revelou o desânimo dos bolsonaristas com a situação do candidato. Dados do Monitor da Palver, empresa que desde janeiro acompanha 14 mil grupos públicos que debatem política no WhatsApp, mostraram que o total de mensagens críticas às urnas chegou nesta semana ao seu ponto mais alto desde o início da campanha eleitoral. Mais de 34% das mensagens que circulam no WhatsApp contendo as palavras “urna” ou “urnas” têm conteúdo negativo e crítico. As postagens neutras respondem por 49%, e as positivas por apenas 15%.

Outro sintoma do desânimo foi a quantidade de conteúdos religiosos compartilhados no grupo, pedindo orações para a vitória do presidente ou mostrando Lula como um enviado do demônio. Um dos mais visualizados foi o vídeo em que vários pastores e missionários evangélicos pedem jejum aos eleitores em apoio a Bolsonaro. “Vamos jejuar. Jejuar, orar e pedir misericórdia para que essa praga que veio sobre o mundo cesse e que todas previsões ruins feitas aqui no Brasil caiam por terra”, diz o pastor e deputado federal pelo PL Marco Feliciano, um dos mais ardorosos bolsonaristas do Congresso. O vídeo, porém, é de abril de 2020 e se refere a um jejum contra o coronavírus convocado por Bolsonaro – nada tem a ver, portanto, com a eleição.

O jejum, mesmo assim, passou a ser anunciado por vários integrantes, seguido de orações e pedidos de vitória a Deus. “Deus abençoe a nação e que seja conforme a vontade dele”, escreveu uma eleitora. Outra pediu uma corrente de orações. “Vamos fazer a oração dos 1000 pai nosso, pedindo pelo nosso Brasil, para que haja lisura nas eleições e pelo nosso presidente”, pede a publicação.

Uma participante do grupo, composto majoritariamente por eleitores evangélicos, postou até mesmo um conteúdo em que um vidente prevê, por meio de um baralho cigano e um tal baralho do animal do poder, a vitória de Bolsonaro. Nos dois conjuntos de cartas, as primeiras que saíram, depois que o mago as embaralhou, foram as que representavam o presidente de acordo com o critério adotado pelo mago: um búfalo no baralho do animal do poder, enquanto Lula foi designado com um peixinho dourado, e cavaleiro do bem contra o andarilho vermelho. “Temos duas cartas confirmando Bolsonaro como ganhador no primeiro turno”, diz o bruxo. A revelação foi comemorada pelo grupo como se fosse o resultado oficial proclamado pelo TSE.

Entre o material que circulou pelo grupo havia muito conteúdo antigo, que já foi desmentido ou que sequer virou alvo de investigação. Um card requentado, por exemplo, denunciava que a Brigada Militar de Serafina Corrêa, no norte do Estado, havia apreendido uma caminhonete com quatro urnas eletrônicas, três das quais “com pelo menos 81% dos votos para o Lula PT”. A informação foi atribuída à rádio Odisseia FM, que desmentiu o fato imediatamente. O episódio, na verdade, ocorreu em 2018, quando Lula sequer foi candidato à presidência. A foto, que foi usada também para abastecer uma denúncia falsa no Amazonas, era de uma urna eletrônica sendo transportada com escolta policial em 2015.

Outro vídeo compartilhado no grupo dava conta da apreensão, nas contas pessoais de Lula, de mais de R$ 9 milhões. O conteúdo foi comemorado como uma prova da má conduta do ex-presidente. Mas, na verdade, a reportagem que circulou no grupo foi veiculada no programa Brasil Urgente, do apresentador Datena, em 2017 e se referia a uma decisão do ex-juiz Sérgio Moro que determinou o bloqueio de dois planos de aposentadoria do ex-presidente logo após sua condenação no âmbito da operação Lava Jato, que depois foi anulada pelo STF. A informação foi amplamente divulgada na época.

Também foram compartilhadas, na sexta-feira (30), vídeos repercutindo o último debate entre os candidatos transmitido pela Rede Globo na noite de quinta-feira (29). Os trechos selecionados mostram Lula discutindo com o candidato do PTB, padre Kelmon, e Bolsonaro revelando os pedidos de cargos no governo feitos pela candidata do União Brasil, senadora Soraya Thronicke. Há, além disso, vários memes em que o candidato do PT aparece sendo exorcizado ou com ferimentos supostamente causados durante o programa de TV.

Edição: Sul 21


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