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Governo Leite ignora risco de colapso nos hospitais da Região Metropolitana, dizem prefeitos
O clima de frustração predominou ao final da audiência pública da Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa que debateu, na última segunda-feira (4), a crise dos hospitais da Região Metropolitana e o programa Assistir na Saúde, implementado em agosto de 2021 pelo governo de Eduardo Leite (PSDB).
A frustração começou antes mesmo dos microfones serem ligados, tão logo circulou a informação de que a secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, não estaria presente. Na audiência anterior, no dia 7 de agosto, ela também não compareceu. A data desta segunda, inclusive, foi marcada especificamente para casar com a agenda da secretária. Em sua justificativa, Arita disse que a crise do Samu lhe impediu de ir.
Com os microfones ligados, a apresentação feita por Lisiane Fagundes, diretora do Departamento de Gestão de Atenção Especializada da Secretaria Estadual da Saúde (SES), deu o tom do que seria o sentimento ao final da audiência. Quase um mês depois do encontro anterior, o governo estadual não sinalizou qualquer mudança no discurso ou na prática referente aos recursos cortados dos hospitais da Região Metropolitana de Porto Alegre.
Em relação à audiência anterior, a reunião desta segunda (4) trouxe uma novidade: a constatação de que o grupo de trabalho criado pela SES, no dia 7 de julho, “para avaliar tecnicamente os resultados do Programa Assistir e subsidiar eventual substituição de critérios”, nem sequer se reuniu ainda.
Tudo remete a outubro de 2021, quando 56 hospitais que atendem pelo SUS tiveram corte de 17% dos recursos repassados pelo governo estadual – deste total, 11 hospitais estão localizados na Região Metropolitana da Capital, área que concentra o maior número de atendimentos de saúde da população gaúcha. Inicialmente, a previsão do governo Leite era de mais cortes até dezembro de 2022, quando então se completaria o período de transição do programa Assistir na Saúde.
A reclamação de prefeitos e gestores de hospitais levou o governo a estender o período de transição e congelar outros cortes previstos. Após a primeiro redução de 17%, o planejamento era de novo corte de 33% em março de 2022 e, em agosto de 2022, seria então efetuado o restante do desconto, mantendo somente incentivos fixos dos prestadores. Por enquanto, o congelamento está em vigor até dezembro deste ano.
Desde que o corte de recursos foi anunciado, diversos hospitais da Região Metropolitana reduziram ou fecharam atendimentos. O pedido de prefeitos e diretores de hospitais tem sido um só: que os cortes sejam definitivamente suspensos e que o governo estadual reveja os critérios do programa Assistir na Saúde. Apesar das súplicas, a apresentação da diretora da Secretaria Estadual da Saúde (SES) repetiu os mesmos dados expostos na audiência de agosto e não deu qualquer margem de que os apelos dos prefeitos serão atendidos pelo governo estadual.
Gestores falam em caos
Todos os deputados presentes na audiência pediram para que os critérios do programa Assistir na Saúde seja revistos. Primeiro a se pronunciar, Thiago Duarte (União Brasil) clamou pela ampliação de recursos da saúde para as prefeituras e hospitais da região metropolitana, de modo a evitar que os cortes previstos sejam efetivados. “A medida que os hospitais não tiverem condições de atender um terço dos gaúchos, onde essas pessoas serão atendidas?”, questionou.
Pepe Vargas (PT) destacou que o atual drama dos hospitais já era anunciado em 2021 e que, agora, a crise se consolidou. Usando a metáfora do cobertor curto, o deputado disse que enquanto uns municípios ganham mais recursos, outros perdem, e que tal situação exige a discussão dos critérios dos repasses financeiros. Discussão que, enfatizou o parlamentar, o governo Leite se recusa a fazer.
O Programa Assistir foi criado com a perspectiva de ter uma sistemática “mais equânime e racional” na distribuição de recursos públicos, “buscando a efetiva entrega de serviços para a população”, segundo anunciou o governo do Estado. O programa tem a lógica de cortar recursos de 56 hospitais (11 dos quais estão na Região Metropolitana) e direcionar a verba para outros hospitais com menos financiamento. A justificativa do governo é que os hospitais que terão a verba cortada “produzem pouco”, enquanto outros se propõem a “produzir mais”.
O critério de produtividade definido pelo governo Leite está no centro da polêmica. Prefeitos, secretários de saúde e gestores hospitalares criticam que tais critérios nunca foram explicados. Outra queixa recorrente é que o programa foi implementado sem qualquer diálogo com os municípios. Lisiane Fagundes, diretora do Departamento de Gestão de Atenção Especializada da Secretaria Estadual da Saúde, disse na audiência que o governo tem sim os critérios, mas ela achou que o encontro desta segunda “não era o momento adequado para trazer detalhes”. A reclamação generalizada é que tais critérios também não têm sido apresentados nos pedidos de reunião e explicação feitos por prefeitos e diretores de hospitais.
Em sua manifestação, a deputada Stela Farias (PT) criticou o grau de subjetividade nos argumentos da criação do programa. “Quais são os critérios? O que falta? Onde falta?”, perguntou. “Não podemos desabastecer a região que atende ‘o grosso’ da população do Rio Grande do Sul. A regionalização tem que ter bom senso e clareza sobre o porquê das coisas. Não é possível continuar neste situação. O Assistir não deu certo. O Assistir não assiste. O governo precisa rever esse programa”, afirmou.
Se a programação original do programa, que vigoraria até dezembro de 2022, tivesse sido cumprida, o Hospital São Camilo, de Esteio, teria perdido R$ 20 milhões em repasses do governo estadual. De R$ 24 milhões por ano (cerca de R$ milhões/mês), receberia apenas R$ 4 milhões.
O Hospital de Canoas, que recebia R$ 49 milhões/ano do governo estadual, com os cortes projetados receberá R$ 6 milhões. Em Porto Alegre, a situação não é diferente. O Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre (HPS) recebia R$ 35 milhões e com os cortes previstos no programa Assistir, receberá somente R$ 10 milhões. O Hospital Restinga e Extremo Sul perderá quase R$ 10 milhões de um total de R$ 13 milhões. O Hospital Materno Infantil Presidente Vargas perderá 50% dos recursos estaduais, caindo de R$ 10 milhões para R$ 5 milhões.
Prefeito de Canoas, uma das cidades mais afetadas pelo corte do programa, Jairo Jorge lembrou que há cerca de 15 anos começou a ser montada uma rede de proteção nos hospitais da Região Metropolitana para que Porto Alegre parasse de receber ambulâncias do interior do estado – era a época da “ambulânciaterapia”, comentou o prefeito. Com o corte de 17%, o Hospital Universitário de Canoas já perdeu R$ 14 milhões e o Hospital de Pronto Socorro do município tem previsão de perder quase metade dos R$ 44 milhões que recebe do governo estadual.
“Essa redução de dinheiro trouxe a crise para o hospital universitário. Queremos ampliar a crise? O fechamento do Hospital Universitário vai trazer o caos para Porto Alegre”, previu. “Vamos fechar o pronto socorro? Estou pedindo que haja reconsideração.”
Embora governe uma cidade que não tem hospital, Rodrigo Battistella (PT), prefeito de Nova Santa Rita, se somou ao coro de quem pede para que os cortes previstos no programa Assistir na Saúde sejam revistos. Isso porque a população de Nova Santa Rita costuma ser atendida nos hospitais da Região Metropolitana, principalmente Canoas, explicou Battistella.
Ele destacou não ser contra o programa Assistir na Saúde e que a intenção dos prefeitos é discutir o assunto com a Secretaria Estadual da Saúde (SES). Diálogo que, até o momento, afirmou não ocorrer. “Não há preocupação do governo do Estado em saber como estes hospitais ficarão em pé. A gente não pode melhorar o interior do estado e criar um caos na Região Metropolitana”, disse o prefeito de Nova Santa Rita, pedindo para não haver mais cortes. “Não é possível retirar nenhum centavo a mais dos hospitais da Região Metropolitana.”
O pedido de diálogo também foi central nas palavras de Ana Boll, diretora do Hospital São Camilo, de Esteio, e coordenadora do Fórum de Saúde da Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre (Granpal). “Queremos fazer uma discussão técnica e isso não está acontecendo. Quais os parâmetros? Estamos fazendo só um pedido: sentar e conversar sobre isso, ver os números, discutir a matriz do Assistir”, falou a diretora do Hospital São Camilo, instituição que dos R$ 24 milhões que recebe anualmente do governo estadual (cerca de R$ milhões/mês), receberá apenas R$ 4 milhões se o programa Assistir for adiante.
Contrato com o colapso
Proponente da nova audiência pública que debateu o problema na Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, o deputado Miguel Rossetto (PT) não disfarçou sua insatisfação ao final da reunião. A começar pela ausência da secretária Arita Bergmann. Para o parlamentar, se ela trata assim o parlamento gaúcho, não surpreende que não ouça as críticas dos prefeitos da Região Metropolitana.
Rossetto cobrou que o programa, tal como está posto, seja interrompido, criticou o fato do grupo de trabalho montado pelo governo para analisar o Assistir ainda não ter se reunido dois meses depois da sua criação, e lembrou que, nos próximos, o governo Leite entregara na Assembleia sua proposta de orçamento de 2024. Quando a proposta surgir, disse Rossetto, o parlamento não poderá “assinar um contrato com o colapso da saúde no Rio Grande do Sul.
Para o deputado, para além do debate sobre o programa Assistir, é fundamental que o governo estadual amplie os recursos para a área da saúde. “Não é só pensar a melhor distribuição do recurso existente, isso é obrigação. Temos que pensar nas necessidades da população gaúcha”, exclamou.
E olhando diretamente para as representantes do governo na audiência, questionou se a Secretaria Estadual da Saúde está satisfeita com os recursos existentes. “Qual cenário vocês trazem para o ano que vem com esse orçamento? A fila vai reduzir? O tempo de resposta vai melhorar?”, perguntou.
Durante a reunião, Rossetto apresentou cálculos mostrando que o financiamento hospitalar deveria ser R$ 494 milhões superior apenas considerando a reposição da inflação entre 2014 e 2022. Por fim, o deputado anunciou que a secretária Arita será convocada a prestar esclarecimentos à Assembleia, em data ainda a ser agendada.
Fonte: Site Sul21
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