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Contraponto: Reeleita com recorde de votos, Fernanda Miranda alerta: ‘Pelotas não pode retroceder’

Contraponto: Reeleita com recorde de votos, Fernanda Miranda alerta: ‘Pelotas não pode retroceder’

Em um cenário político onde a representatividade feminina ainda enfrenta muitos desafios, a reeleição de Fernanda Miranda, vereadora pelo PSol e novamente a mais votada nas eleições ao parlamento pelotense, se destaca como um marco significativo. Com uma trajetória de luta em defesa dos direitos das mulheres e das minorias, Fernanda é uma voz ativa que transcende as barreiras impostas por uma estrutura política predominantemente masculina e conservadora. Sua atuação nas comunidades de Pelotas e seu compromisso com causas sociais têm atraído a atenção e o apoio de um número crescente de eleitoras e eleitores, especialmente entre as jovens.

Em entrevista ao programa Contraponto na manhã desta terça-feira (8), Fernanda compartilha suas reflexões sobre os desafios enfrentados por mulheres na política, a importância da inclusão de questões de gênero na educação e as estratégias necessárias para promover uma mudança real na representação feminina. Ela também não hesita em abordar a disputa entre o PT e o PL na corrida pela prefeitura no segundo turno, destacando o retrocesso que o candidato Marciano Perondi representa para a cidade. Segundo ela, a ascensão de uma liderança conservadora e de extrema direita, como a de Perondi, ameaça não apenas os avanços conquistados, mas também a luta pela igualdade de gênero e os direitos das minorias. Com sinceridade e coragem, Fernanda discute a necessidade urgente de uma revolução de consciência fora do parlamento, reforçando que a luta por uma Pelotas mais justa e igualitária deve ser coletiva e constante.

Contraponto: Como você vê essa nova composição da Câmara, ainda mais com a diminuição de representatividade feminina e negra, e com o segundo vereador mais votado sendo do PL - o partido mais representativo da extrema-direita brasileira?

Fernanda Miranda: É preocupante, sim. No nosso mandato, ficamos satisfeitos com a votação, que reflete nosso trabalho de base e nossa atuação. Porém, é evidente que o cenário mudou. Desde 2022, quando conseguimos tirar Bolsonaro do poder, já se percebia essa polarização entre a esquerda e a extrema-direita, e agora isso se reafirma nas eleições municipais. Embora tenha havido avanços, há também um crescimento expressivo da extrema-direita, o que traz muitos desafios. O segundo colocado em Pelotas se define como "vereador de Bolsonaro", e isso tem um apelo forte.

Contraponto: Você acredita que esse cenário pode afetar diretamente a governabilidade no município?

Fernanda Miranda: Sem dúvida. Estamos num momento delicado, em que precisaremos de muita articulação. A extrema-direita avança, mas a esquerda também se fortalece em determinados espaços. E isso coloca em xeque como será a relação com o Executivo, quem for eleito. Em Pelotas, vemos um segundo turno polarizado entre Fernando Marroni (PT) e Marciano Perondi (PL), e ambos vão precisar do apoio da Câmara para governar. A questão é como essa articulação será feita. Marroni já sinalizou a disposição para o diálogo, enquanto Perondi declarou que não quer conversa com o PSDB. Até que ponto isso é realista, não sabemos.

Contraponto: A senhora acredita que a postura de "não querer diálogo" com certos partidos é sustentável?

Fernanda Miranda: As conversas são parte do jogo político. Não podemos nos iludir. Estamos dentro de um sistema capitalista e, dentro desse sistema, é normal que haja diálogos e negociações. A questão é como essas negociações são conduzidas. Precisamos defender um projeto que realmente esteja enraizado nas demandas da população. O Marroni, por exemplo, já foi prefeito, conhece Pelotas, e a Daniela Brizolara, nossa companheira de chapa, é uma mulher negra que representa muito bem a nossa cidade. São essas vivências que precisam estar à frente, e não projetos prontos de fora, como o do Perondi.

Contraponto: O que te preocupa mais no projeto de governo do PL?

Fernanda Miranda: O Perondi já sinalizou que pretende desburocratizar licenças ambientais, o que pode ser um problema grave para nossa cidade. Ele também fala em privatizações, como do esgoto e da água, algo que consideramos inaceitável. A lógica de desenvolvimento dele passa por cima da nossa história, das nossas condições sociais e culturais. Nós precisamos de um governo que ouça a população, que dialogue com as pessoas que vivem os problemas da cidade diariamente, e não alguém que chegue de fora achando que sabe tudo.

Contraponto: Quais são as expectativas para o segundo turno?

Fernanda Miranda: Temos muito trabalho pela frente. Estamos defendendo a eleição do Marroni com a Dani, porque acreditamos que essa é a única forma de evitar que a extrema-direita avance ainda mais em Pelotas. Precisamos de um governo que esteja comprometido com as pautas do povo, que nos ouça e que esteja disposto a construir um projeto coletivo. Essas próximas semanas serão decisivas, e é hora de intensificar o diálogo com a população.

Contraponto: E como você enxerga a relação entre o Legislativo e o Executivo daqui para frente?

Fernanda Miranda: Vai ser desafiador, com certeza. A Câmara terá uma composição diversa, e quem for eleito prefeito precisará dialogar muito. O que esperamos é que esse diálogo seja pautado em projetos que atendam às necessidades reais da população, e não em trocas políticas que só favorecem uma pequena elite. Precisamos lutar por um governo que tenha responsabilidade com a vida das pessoas, que esteja realmente comprometido com o futuro da nossa cidade.

Contraponto: Fernanda, você mencionou que seu trabalho na Câmara sempre foi marcado pelo enfrentamento. O que te motiva a continuar?

Fernanda Miranda: Eu entrei na Câmara e sigo nessa linha de enfrentamento porque não estou ali para brincar ou fazer amizade. Estou ali para lutar pelo que precisa ser enfrentado. Nosso povo sofre com políticas irresponsáveis, com a lógica do "toma lá, dá cá". E mais do que isso, Pelotas tem sido explorada por muito tempo. As pessoas vêm, exploram, e depois nos deixam sem nada. Mas Pelotas tem muita potência: cultural, histórica, turística, temos a nossa Lagoa. No entanto, precisamos urgentemente resolver a questão do esgoto. E se o governo federal olhar para nós com mais atenção, isso vai ser mais viável.

Contraponto: Quais são os desafios principais na política local para conseguir essa atenção do governo federal?

Fernanda Miranda: Um dos maiores problemas que enfrentamos é a falta de projetos. O PSDB, que está no poder, não tem feito projetos de infraestrutura importantes. Tudo é muito difícil, cheio de interesses particulares, empresas ditando normas, como estamos vendo na flexibilização das leis ambientais que está sendo debatida na Câmara Municipal. Esse é o cenário que queremos evitar, onde as leis são feitas para servir a interesses privados. Estamos à mercê de um projeto autoritário que pode piorar as coisas.

Contraponto: Diante desse cenário, como você vê o crescimento do PL em Pelotas? Recentemente, vimos o candidato Marcelo Bagé, do PL, ser o segundo mais votado para a Câmara Municipal. Isso representa uma mudança significativa, não?

Fernanda Miranda: Sim, o PL está se estruturando aqui, algo que antes era impensável. Mas isso só reforça a necessidade de nos organizarmos também. Temos sindicatos, lutas populares e movimentos como o Solidariedade Pelotas, que surgiu em meio a essa resistência. Precisamos fortalecer esses espaços e estar junto com as pessoas, especialmente nas áreas mais abandonadas, como a Z3 e a Barra. A extrema direita se organizou e isso exige que nos organizemos também - mas já estamos fazendo isso, a unidade da esquerda nas eleições é um grande exemplo.

Contraponto: Então, apesar do crescimento da extrema direita, você acredita que há espaço para a esquerda se fortalecer ainda mais?

Fernanda Miranda: Com certeza. Se eles vêm com força, nós também precisamos ser fortes. O PL teve uma grande expressão por ser associado ao Bolsonaro, mas nós viemos com uma grande expressão também, representando a classe trabalhadora. Agora, nosso papel é criar resistência e, mais do que isso, criar proposições. Precisamos dialogar com as pessoas e cobrar daqueles vereadores mais alinhados à extrema direita. Eles também precisam ouvir o povo. Nosso trabalho é garantir que essas vozes sejam ouvidas. E a organização já começou. Esta semana mesmo retomamos o nosso trabalho de fiscalização e vamos continuar cobrando do governo atual até o último minuto. Eles são responsáveis por muito do que está acontecendo em Pelotas. E a partir do ano que vem, independentemente de quem estiver no governo, seguiremos organizados, seja para resistir a projetos que não nos favorecem ou para propor novas soluções com uma frente popular.

Contraponto: E qual é o papel dos movimentos populares nesse contexto?

Fernanda Miranda: Eles são fundamentais. Não podemos esperar por salvadores. Nós somos nossos próprios salvadores, através da organização popular. É por isso que digo que não estou sozinha nessa luta. Precisamos sentir essa unidade e agir juntos. Nossa tarefa agora é mostrar para as pessoas quem somos, mostrar que estamos dispostos a ouvir e construir soluções com elas. Um governo democrático onde as pessoas sejam ouvidas, com um orçamento participativo, é essencial. Já vimos muitos retrocessos, e a população está cansada de resistir. Não queremos apenas resistir, queremos construir algo novo, algo que seja bom para a cidade e para o povo. Precisamos ser ouvidos e construir juntos. Não é fácil, mas eu tenho a certeza de que não estamos sozinhos. Todas as pessoas que enfrentam o bolsonarismo e as ideias retrógradas sabem que o caminho é difícil. Mas estamos unidas. Essa é a nossa força. A tarefa é enorme, mas estamos dispostas a seguir em frente.

Contraponto: Fernanda, vamos falar um pouco mais sobre a representatividade das mulheres na política, um tema tão importante. Nós vimos recentemente a aprovação da inclusão da história das mulheres nos currículos escolares, uma conquista significativa. Mas, ao mesmo tempo, nas eleições municipais, essa representatividade diminuiu. Como podemos inverter esse quadro?

Fernanda Miranda: Esse é um ponto muito crucial. A questão da representatividade das mulheres na política passa por muitos fatores. Primeiro, há uma dificuldade interna que nós mesmas enfrentamos. Muitas vezes, ao ouvir alguém sugerir que deveríamos ser candidatas, a primeira coisa que pensamos é: “será que sou capaz?”. Essa insegurança é comum. Mesmo quando vemos mulheres ativas e engajadas, muitas não se reconhecem como candidatas. Essa falta de autoconfiança é um dos principais obstáculos. É uma luta constante. E as mulheres que estão na política enfrentam uma estrutura que dificulta ainda mais a sua entrada. Muitas delas estão sobrecarregadas, trabalhando em múltiplos turnos, cuidando da casa, dos filhos, e isso é muito desafiador. Eu mesma, sempre estou correndo, tentando dar conta de tudo. O ambiente político é muito hostil para nós. Eu já enfrentei diversas violências e, às vezes, sinto que poderia desistir - e isso é uma forma de violência também. Precisamos constantemente lembrar que fazemos a diferença. E, infelizmente, vivemos em uma sociedade muito machista, onde muitas vezes não somos reconhecidas pelo nosso valor.

Contraponto: O que você acredita que poderia ser feito para melhorar essa situação?

Fernanda Miranda: Precisamos de uma mudança estrutural. A política precisa ser um espaço onde as mulheres se sintam seguras e valorizadas. A maioria dos homens que está na política não sabe o que significa ter que fazer as tarefas de casa antes de ir a uma reunião. A desigualdade começa aí. É fundamental que a sociedade reconheça as dificuldades que enfrentamos. Precisamos de uma educação que trabalhe a questão de gênero, que mostre a história de mulheres que lutaram e fizeram a diferença. Não podemos deixar que a nossa história e a luta das mulheres sejam apagadas.

Contraponto: Você sente que a sua vitória nas eleições é um passo nesse sentido?

Fernanda Miranda: Com certeza! Ser a mais votada em Pelotas, pela segunda vez, é um marco. Isso mostra que há um reconhecimento do nosso trabalho. E muitas jovens se aproximaram de nós nessa campanha. Isso é esperança!

Contraponto: E como o mandato pode fortalecer essa representatividade?

Fernanda Miranda: Vamos usar esse espaço para nos organizarmos e dialogarmos mais com as mulheres, principalmente as jovens. Precisamos mostrar que elas também podem ser candidatas e ocupar esses espaços. A revolução não vai acontecer apenas dentro da Câmara, mas sim fora dela, na conscientização das pessoas. Acredito que a participação da sociedade civil é fundamental. A luta é coletiva. Não podemos esperar por salvadores. Precisamos nos unir e lutar juntas. E essa conversa é importante, porque é assim que podemos construir um futuro mais igualitário.

Contraponto: O que você diria para as mulheres que têm receio de se engajar na política?

Fernanda Miranda: Eu diria que a política precisa de vocês! Não deixem que o medo as impeça de lutar pelos seus direitos. Nós precisamos de mais vozes femininas na política. Espero que possamos ver mais mulheres ocupando espaços de poder, trazendo suas experiências e lutas. Precisamos que a política reflita a diversidade da nossa sociedade. Acredito que estamos no caminho certo, mas ainda temos muito a fazer.

*Você confere a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.


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