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Ausências no evento de 8 de janeiro indicam reorganização da direita com foco nas eleições, avaliam especialistas

Ausências no evento de 8 de janeiro indicam reorganização da direita com foco nas eleições, avaliam especialistas

Passada a cerimônia que marcou o aniversário de um ano dos atos extremistas de 8 de janeiro em Brasília (DF), o significado da ausência de determinados atores no evento de segunda-feira (8) ganhou diferentes leituras entre analistas que acompanham o desenrolar do jogo político nacional. Além do não comparecimento de 14 dos 27 governadores, chamou atenção a ausência do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).

Lira passa férias em Alagoas e, por meio de sua assessoria, alegou que não viria à capital federal para o evento por problemas de saúde na família, mas a ausência deixou no ar o que estaria por trás decisão. Correram o mundo os rumores de que parlamentares mais conservadores, também ausentes, alegaram que a solenidade teria ganhado um tom partidário ou governamental e por isso viram como positiva a ausência de Lira.

Esse mesmo aspecto teria sido considerado ainda pelos governadores faltosos, como Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo, Jorginho Melo (PL), de Santa Catarina, e Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais. Este último inicialmente indicou que não iria ao ato, depois confirmou presença em cima da hora, mas acabou não comparecendo. O governador esteve em Brasília, mas optou por outra agenda na capital.

Para o cientista político Francisco Fonseca, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), tais ausências evocam uma simbologia que não só revela a atual configuração do jogo político nacional, mas também dá algumas pistas sobre o futuro.

"Vejo isso como uma demarcação de território político-eleitoral, inclusive pensando nas eleições, talvez até já nas eleições municipais deste ano. Acho que esse é o primeiro aspecto. E o segundo é de mais longo prazo, de se tentar uma organização da direita no Brasil, porque a direita e a extrema direita foram derrotadas [nas urnas] e estão em processo de reorganização. É uma marcação de posição, de espaço e de dizer que a direita não se confunde com qualquer coisa que possa ter uma cara progressista."

Questionado se esse movimento teria relação com o grupo da chamada "terceira via" – que, apesar da manutenção da polarização política no país, segue na batalha por mais espaço entre o eleitorado –, o professor afirma que enxerga ligação, mas pondera que o segmento da direita no Brasil continua com muitas diferenças internas. "É preciso lembrar que essa chamada 'terceira via' é uma direita mais moderada, que não tem interesse na polarização, nas pautas de costumes, por exemplo."

"O campo direita/extrema direita é multifacetado. Tem setores antipetistas, tem um setor de lavajatistas, tem os mais liberais, os mais conservadores. Esse pessoal todo está num processo de readequação depois da derrota do Bolsonaro. O próprio Tarcísio de Freitas, que tem o Gilberto Kassab como homem forte do seu governo, representa uma tentativa – muito mal engendrada em São Paulo – de querer o eleitorado bolsonarista, mas sem ser bolsonarista. Estamos num processo de freio de arrumação da direita no Brasil, então, a ausência no evento de 8 de janeiro tem vários significados, mas eles são distintos pra essas várias frações da direita", esmiúça Fonseca.

Lira

No caso particular de Lira, a não participação na cerimônia pode ter sido balizada ainda por outros elementos, segundo avaliam analistas. "O fato de o evento ter ocorrido sob a liderança do Pacheco, por exemplo, pode ter contribuído, mas eu acredito que aqueles que não compareceram ao ato mais perderam politicamente do que ganharam", observa o consultor político Antônio Augusto de Queiroz, ao destacar a constante disputa por protagonismo entre os dois presidentes.

A ausência irritou o governo Lula, que evitou acenos públicos nesse sentido para não azedar a relação, mas viu a decisão de Lira como um possível mau sinal. Em um cenário em que o Legislativo vem ampliando o poder a cada ano, a gestão teme que isso seja um indicativo de que o presidente da Câmara passe a cobrar mais caro pelo apoio ao governo em 2024, ano em que a Casa deverá se debruçar sobre uma série de pautas de relevo. Entre elas estão as leis que devem regulamentar trechos da reforma tributária.

Apesar disso, especialistas ouvidos pela reportagem pontuam que Lira enfrenta também algumas barreiras. "Ele tem armas, mas não tem tantas assim. Ele não controla o Senado e não controla o STF, por exemplo, além de ter um telhado de vidro gigantesco e ser alvo de várias investigações e denúncias. Eu entendo que ele tem alguns limites, inclusive para criar problema", avalia o professor Pablo Holmes, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol/UnB).

Holmes não vê cenário para "problemas sistemáticos" ou armadilhas mais arriscadas por parte de Lira diante do governo este ano. "Acho que não seria interessante pra ele. Se ele abrir guerra, por exemplo, ele não tem tantas garantias assim. Não existe espaço político no Congresso Nacional para algo como um impeachment, por exemplo", ressalta.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Queiroz sublinha que, apesar do grande poder que Lira capitalizou ao longo dos últimos anos no comando da Câmara, o futuro do líder do centrão está, de certa forma, relacionado com sua relação com o governo Lula, principal fiador do evento de segunda-feira.

"O Lira sabe que o futuro político dele depende em certa medida do governo, porque o mandato dele na presidência da Câmara termina em janeiro de 2025 e ele fica em 2025 e 2026 sem o poder de presidente da Casa. Tendo contra ele o governador de Alagoas e dois senadores do estado, se ele não tiver proximidade com o governo federal e o governo tiver numa linha de oposição a ele, ele vai ficar numa situação muito delicada, inclusive para renovar o mandato, e sem qualquer chance de eventualmente pleitear [vaga no] Senado pelo estado dele."

Fonte: BdF


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